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Marilsa Freitas

Marilsa Freitas

“A vida como ela é” 

 

Nasci em São Paulo, agosto de 1969, a quarta filha de 5, somos em 2 homens e 3 mulheres. Meu pai caminhoneiro e minha mãe, costumo dizer que era CEO do lar, pois cuidava de absolutamente tudo, 5 filhos, casa, dinheiro e ainda costurava para colaborar na renda familiar, e nunca deixava de ajudar quem estava necessitando. 

 

Quando tinha 4 anos, meu avô paterno faleceu, e com isso fomos morar em Assis, interior de SP. Sim que infância! Uma casa em um quintal que aqui em SP, chamamos de chácara, nem queria ir para a rua, mas podia à vontade…nossa parece que senti até o cheiro do pão caseiro, feito por minha mãe, uma delícia! 

 

Naquele tempo não tínhamos telefone, meu pai viajava para Paraguai, Uruguai, Mato Grosso, buscando gado para frigorífico, algumas vezes chegava a ficar até 30 dias longe de casa, e me lembro que ele mandava cartas e quando era algo urgente, telegramas. Me lembro da minha mãe colocar a camisa dele para dormir quando estava com saudades… meus pais eram muito humildes, mas o que não faltava em nossa casa era amor. Uma história de amor linda a dos meus pais, permaneceram casados por 51 anos, e um não largava o outro por nada, nunca os vi brigar em nossa frente. 

 

Minha primeira aventura em vendas foi aos 8 anos, meu pai adorava fazer coisas manuais, e para passar o tempo enquanto esperava as cargas ou descargas, aprendeu a fazer vasos de pneus, e um dia, resolvi vender alguns e deu muito certo, ele me dava umas moedas, já nem me lembro qual era a moeda. Eu adorava oferecer e conseguir fechar o negócio, aí já estava meu futuro, sem perceber. 

 

Meus irmãos mais velhos queriam e precisavam trabalhar, para ajudar na renda familiar, e estudar, mas na cidade onde morávamos não tem indústrias, é uma cidade universitária, com comércio e muitos médicos. Com isso retornamos para São Paulo, e acho que foi a primeira sensação de perda que senti, eram outros tempos, até podia brincar na rua, mas as pessoas muito diferentes. Todos nós sofremos um pouco, mas as coisas foram se ajeitando. 

 

Minha mãe sempre nos incentivou a estudar, preferia nos ver com um livro nas mãos, que ajudando nos serviços de casa. Dos cinco filhos, quatro seguiram caminho do bem, e uma se perdeu no meio do caminho, e até hoje não entendo, pois recebemos a mesma educação, os mesmos princípios, acho que foi o único sentimento de fracasso dos meus pais. 

 

Eu sempre fui bem determinada, aos 14 anos, ia pagar contas no Bradesco, e ali já ficava perguntando ao funcionários, o que deveria fazer para trabalhar. Imaginava “é uma grande empresa, deve ser legal e pagar bem”...rs, nessa época meu sonho era ser jornalista, tipo apresentadora de telejornal. Aos 16 anos, enfim, meu primeiro emprego, onde? sim no Bradesco, e daí em diante nunca mais parei, sempre fui reconhecida por todos os trabalhos por onde estive, não sei o que é seguro desemprego, a única demissão que sofri, foi por PDV, na BCP, depois da fusão com a Claro,e quinze dias depois já estava trabalhando na Vivo. 

 

Terminei o ensino médio em escola pública, mesmo trabalhando era muito difícil pagar uma faculdade. Segui trabalhando, fazendo cursos, e aos 24 anos, entrei em uma faculdade particular e não fiz jornalismo, a vida corporativa me levou para outro caminho, que sou grata, pois sabe aquela vendedora de vasos aos 8 anos?! Me encontrei era isso que eu queria! 

 

Minha carreira sempre foi muito bem sucedida, por todos os trabalhos fui reconhecida, ganhei dinheiro, prêmios, promoções, mas sempre evitava me tornar uma gestora, achava que era boa sendo colega de trabalho, ajudando como equipe. Pensar que poderia depender do outro para fazer meu resultado, me deixava vulnerável e com muito medo. Por mais que todos falassem, e minhas avaliações apontavam para esse caminho, eu relutava dizendo não. Mas tudo isso tem um preço: o tempo. Trabalhava muito, horas e mais horas, dia, noite, finais de semana. Eu adoro trabalhar e não imagino minha vida sem o trabalho, só que o mundo corporativo te engole, e eu quase fui engolida. Só caí na vida real depois de um baque, daqueles que acontece para te mostrar o quanto você não é o CNPJ, e sim um CPF. 

 

Sofri um acidente de carro, e coloquei a vida de outra pessoa em risco de morte, virei um zumbi por 5 dias, não comia, não dormia, só pensava que eu fui a causadora daquela situação, e o motivo: trabalhando no trânsito, sem atenção ao volante. Graças a Deus a pessoa se recuperou, eu dei o suporte que foi necessário, e depois de dois anos, dei alta desse assunto e segui. Agora esse chacoalhão que a vida me deu, me fez perceber o quanto somos substituíveis. Somos números nas corporações e com todo apoio do meu marido, fui repensar minha vida profissional, e então me tornei uma gestora de gente, e descobri que eu era boa nisso. 

 

A idade passando eu já com 5 anos de casada e não queria filhos, não conseguia imaginar uma boa mãe - já que não abriria mão do trabalho, e aí surpresa, uma Endometriose, daquelas bem sofridas, foram 2 anos de tratamento clínico, quando meu médico, disse “teremos que partir para cirurgia”, e me explicou que com isso, não poderia ser mãe por vias normais, sabe qual foi minha reação? De alívio, não queria ser mãe mesmo. Ele passou um medicamento, cheio de reações adversas, e cortou o anti-concepcional, pois a possibilidade de eu engravidar era praticamente 0,00001%, e Alice foi esperta, aproveitou esse % e veio, risos. 

 

Nada de cirurgia para endometriose - que aliás, se curou, mas um mês depois de descobrir minha gravidez, tive a pior notícia da minha vida: Minha mãe foi diagnosticada com um câncer na vesícula, e tinha apenas 6 meses de vida. Ou seja, eu gerando uma vida e perdendo quem gerou a minha. Com apoio do meu marido pedi demissão, isso mesmo, passar mais tempo com minha mãe nesse momento era mais importante, porque o tempo era curto. Consegui acompanhar o tratamento até o fim de sua vida, graças a tecnologia ela conheceu a Alice pelo ultrassom 3D, conseguiu deixar paninhos e toalhas bordadas, faleceu 60 dias antes da Alice nascer. E sabe aquele medo de ser uma péssima mãe? Passou, e me considero uma ótima mãe, risos. Mais um medo superado. 

 

Quando parei de trabalhar CLT, comecei a pegar algumas consultorias e descobri que não ganhava tanto dinheiro, mas que estava muito mais feliz, sendo a CEO da minha vida. Não é fácil, tive um projeto que quase me engoliu novamente, era de um ano e durou quase sete anos. Até que foi a vez da Alice, me trazer ao mundo real, e dizer que não aguentava mais ficar em período integral na escola. Hora de refletir e medir a importância e prioridade das coisas. 

 

Sim minha filha, minha familia é mais importante, e com isso, assumo menos compromissos, e a qualidade e relação que estamos construindo vale muito mais a pena, que qualquer valor que eu pudesse receber. Mas, adoro trabalhar, não conseguiria ser só mãe, esposa e dona de casa, gosto de gente, gosto de resultados, gosto de compartilhar e receber novos conhecimentos, e fiz disso minha profissão, parte do sustento da minha família e mais importante: leve e feliz. 

 

Aliás, não posso deixar de ser grata por Deus ter me presenteado com minha alma gêmea, sei que não é bom fazer propaganda, mas tenho o melhor homem, marido, amigo, pai, ao meu lado: o amor da minha vida. Se eu não precisasse me preocupar com dinheiro nunca mais, sairia em uma viagem pelo mundo, com minha família, sem lugar certo, conhecendo novas culturas, histórias, pessoas. Sabe tipo comprar um trailler, uma vida de missionária, risos, onde eu pudesse fazer a diferença na vida das pessoas, e olha que minha filha apoiaria muito rs. Mas analisando os meus 50 anos de vida, sou muito privilegiada, tive base familiar, nunca me faltou amor, comida, educação, trabalho, hoje que mais quero é trabalhar o necessário, viver intensamente cada momento, acompanhar a evolução e crescimento da minha filha, não dever para ninguém, poder ajudar alguém,envelhecer com saúde e ao lado do meu marido, ou seja a vida como ela tem que ser, sem neuras, sofrimentos desnecessários. 

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