O que o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha tem a nos dizer sobre o Brasil de hoje
- Jessica Naur

- 25 de jul.
- 3 min de leitura

Criado em 1992, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha é um marco político que reconhece o protagonismo das mulheres negras na luta contra as diversas opressões que atravessam suas histórias: o racismo, o machismo, a exclusão social, a desigualdade econômica e a negação de direitos básicos.Mais do que uma data simbólica, é uma convocação à escuta, ao reconhecimento e, principalmente, à criação de políticas públicas de inclusão.
“Celebrar o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, pra mim, é muito importante no sentido de reconhecer toda a trajetória de luta. Mesmo com algumas vitórias, estamos longe de conquistar tudo o que é necessário”, afirma Aline Lima, conselheira da Cruzando Histórias e Head de Diversidade, Equidade e Inclusão da América Latina na Natura. “Essa é também uma data para reconhecermos as muitas mulheres que vieram antes de nós. Essa ancestralidade que foi trilhando este caminho, abrindo espaços para que a gente pudesse ter voz, ter vez.”
Na nossa sociedade, uma mulher branca pode sofrer com machismo ou xenofobia. Isso, por si só, já a abala física e emocionalmente. Mas mulheres negras vivenciam essas situações de forma ampliada: elas são atravessadas por preconceitos de cor, gênero, situação financeira, origem, orientação sexual, entre outros marcadores sociais que operam simultaneamente.
Foi para explicar essa experiência que a jurista Kimberlé Crenshaw cunhou, nos anos 1980, o termo interseccionalidade — um conceito que nos ajuda a entender, de forma mais clara, como essas opressões não acontecem de forma isolada, mas se entrelaçam e se reforçam.
A interseccionalidade também escancara a desigualdade em diversos âmbitos, como no mercado de trabalho, por exemplo. Em 2019, apenas 13% dos CEOs no Brasil eram mulheres. De acordom com uma pesquisa realizada pelo Instituto Ethos apenas 3,4% dos cargos de liderança são ocupados por mulheres negras. Em setores como tecnologia, apenas 12% das mulheres envolvidas na área são negras.
“Quando a gente olha para o trabalho do cuidado, esse trabalho que movimenta uma boa fatia da economia, vemos muitas mulheres negras sendo mal remuneradas ou não remuneradas. Elas estão lá, sendo invisibilizadas. Quando a gente olha para todos os números, todos os marcadores, essas mulheres estão com os piores índices”, afirma Aline.
É esse acúmulo de invisibilização que torna o 25 de Julho tão necessário. Ele nos obriga a olhar para o papel central das mulheres negras na construção da sociedade e a perguntar por que ainda estão à margem da sociedade e fora dos grupos de tomada de decisão.
“Ainda precisamos mudar muitas coisas nos próximos anos. Desde o lugar de reconhecimento do papel dessas mulheres, que hoje são a base da sociedade, até um lugar de equidade mesmo — salarial, de empregabilidade, de reconhecimento”, reforça a Conselheira da Cruzando Histórias.
“Acredito que o governo tem o seu papel, assim como as organizações do terceiro setor. Mas as empresas têm uma responsabilidade que vai além do social. É uma pauta de negócio. Estamos falando de uma maioria que consome, que trabalha, que tem potencial, tem tecnologia social, conhecimento técnico e formal — inclusive de pós-graduação. Não vai existir uma sociedade onde uma empresa possa crescer e prosperar enquanto houver desigualdades extremas.”
O Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha é, acima de tudo, uma data para honrar e continuar. Para reconhecer as que vieram antes e para garantir que as que estão aqui agora não sejam silenciadas ou ignoradas. É uma data para olhar a realidade de frente e transformá-la.
“É uma mudança estrutural. Estamos falando de um racismo, de um machismo, de um sexismo que é estrutural — principalmente no Brasil, mas também na América Latina e no Caribe”, finaliza.




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